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Judiciário devolve imóvel da Beneficência Hospitalar para Prefeitura de Mairinque

Parte do prédio retomado pela Prefeitura, onde funciona o PA de Mairinque (foto: divulgação)

Por: Simone Judica*

O Município de Mairinque venceu a disputa judicial contra a Beneficência Hospitalar de Mairinque – BHM e conquistou, em caráter definitivo, a propriedade do imóvel onde estão instalados o Pronto Atendimento Municipal e o Centro de Especialidades e Diagnósticos Médicos – CEDEM, no bairro Jardim Cruzeiro.  O Judiciário também permitiu ao Município incorporar ao patrimônio público, sem qualquer custo, as benfeitorias realizadas no terreno, que tem 1.267 metros quadrados de área construída.

O processo de retomada do imóvel, iniciado em 2015, pelo ex-prefeito Binho Merguizo, foi concluído no Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Brasília. A sentença assinada pela juíza de Direito da Primeira Vara da Comarca de Mairinque, Camila Giorgetti, foi mantida na íntegra.

“A importância de o município ser o detentor da propriedade do imóvel reside no fato de que somente agora é possível estabelecer parcerias com os governos estadual e federal para utilização do espaço, recebimento de recursos para reforma, bem como promover consórcio com municípios vizinhos para a instalação de alguma atividade hospitalar, como por exemplo, uma maternidade”, comemora o ex-prefeito Binho Merguizo.

Os cinco volumes do processo, com quase mil folhas, já foram remetidos à Comarca de Mairinque e, no momento, estão em trânsito, no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, na capital. Quando chegarem ao fórum da cidade, deverá ser expedido ao Cartório de Registro de Imóveis o mandado de averbação, documento judicial que formalizará a transferência da propriedade do imóvel para o Município.

Professor Giovani Huggler

A decisão favorável à Prefeitura foi anunciada ontem pelo vereador professor Giovani Huggler (PDT), durante entrevista concedida ao jornalista Vander Luiz, no programa Linha Aberta, transmitido pela Rádio Estúdio Giromix, de Mairinque.

“Estou muito esperançoso com a notícia de que a Justiça julgou procedente a ação da Prefeitura que foi iniciada em 2015 pelo prefeito Binho Merguizo. Sendo dona do prédio, a Prefeitura poderá fazer reformas e melhorias na área da Saúde, estabelecer convênios e parcerias com o Governo do Estado, empresas privadas e entidades, e assim acabar com problemas como filas de consultas e exames, falta de remédio, aumento de especialidades e implantar uma maternidade para que voltem a nascer mairinquenses em Mairinque”, disse o professor Giovani.

Consultado a respeito dos planos da Prefeitura para o imóvel recuperado, o prefeito Alexandre Peixinho informou que aguarda a chegada dos documentos do processo ao fórum de Mairinque e, ao lado de seu corpo jurídico, diz estar em busca da melhor destinação para o imóvel.

Entenda o caso

Em 1975, durante a gestão do ex-prefeito João Chesine, a Prefeitura de Mairinque doou à instituição denominada Beneficência Hospitalar de Mairinque, por meio de escritura pública, um terreno de 27.900 metros quadrados, com a finalidade específica de que a propriedade fosse utilizada para a construção de um hospital que deveria ser concluído em cinco anos.

De acordo com trechos da escritura de doação contidos na decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo, se o hospital não fosse edificado no prazo máximo de cinco anos ou se suas atividades fossem paralisadas, a Prefeitura de Mairinque teria direito de retomar o imóvel e incorporar as benfeitorias ao patrimônio público municipal.

A doação foi aprovada por meio da Lei Municipal nº 653/1975

A BHM, de fato, construiu um edifício hospitalar e explorou a prestação de serviços na área de saúde até 2009, quando encerrou suas atividades no local.

Nesse mesmo ano, a Prefeitura Municipal de Mairinque passou a alugar parte do prédio, onde estabeleceu a unidade de Pronto Atendimento Municipal (PA) e, posteriormente, ali instalou o Centro de Especialidades e Diagnósticos Médicos -CEDEM. O valor mensal da locação, em 2015, era de R$ 50 mil.

Ex-prefeito Binho Merguizo

“Em 2015, tivemos a informação que o imóvel iria para leilão, a pedido de credores. Preocupados com esta situação e no ímpeto de impedir que um patrimônio de Mairinque, cujo terreno havia sido doado pela municipalidade e o prédio construído com a colaboração da população local, pedi à nossa Secretaria de Assuntos Jurídicos que estudasse o caso para saber se havia alguma possibilidade de retomada do imóvel”, explica o ex-prefeito Merguizo.

A Prefeitura de Mairinque ingressou na Justiça para anular a doação e retomar a propriedade ao tomar conhecimento de que o imóvel da BHM estava prestes a ser leiloado judicialmente para quitação de dívidas que a entidade havia contraído ao longo dos anos com fornecedores e órgãos públicos, como a Receita Federal e o INSS, além de passivo trabalhista.

“Descobrimos que na escritura de doação do terreno, de 1975, havia um encargo de reversão na doação, caso a entidade (BHM) paralisasse suas atividades. Reversão esta com todas as benfeitorias que viessem a ser realizadas. Com isto, a Prefeitura de Mairinque ajuizou Ação de Revogação de Doação em maio de 2015, que agora chegou ao final, revogando a doação do imóvel e revertendo o bem ao patrimônio municipal, após recursos às instâncias superiores”, recorda Binho Merguizo.

Defesa

Em sua defesa, a BHM questiona a validade da cláusula que prevê a retomada do imóvel pelo Município, alega haver cumprido a obrigação de construir o hospital e operá-lo durante décadas e enfatiza a falta de repasses necessários para a continuidade de suas atividades, bem como a interrupção dos pagamentos de alugueis do prédio, por parte da Prefeitura.

A BHM, por sua vez, pediu em juízo indenização pelas benfeitorias agregadas ao imóvel, o que foi negado. “A  escritura que formalizou a doação ora revogada prevê expressamente que a revogação da doação importa reversão ao poder público do imóvel e de suas benfeitorias”,  afirma a juíza Camila Giorgetti na sentença. 

Quanto à alegação da BHM, de que não recebeu os repasses governamentais de que necessitava para manter suas atividades, a sentença é expressa: “conquanto tais repasses pudessem contribuir para que a BHM mantivesse suas atividades, é certo que, tratando-se de pessoa jurídica de natureza privada, deveria contar com outras formas de renda, que garantissem sua autonomia. Pensar de forma diversa significaria reconhecer que o Município, além de doar o imóvel no qual se instalou a requerida, deveria também sustentá-la financeiramente, circunstância que desvirtuaria por completo não só a finalidade do negócio ora analisado, mas o próprio interesse público.”

Mais recursos e decisões

Inconformada com a sentença, proferida em abril de 2016, a BHM apelou para o Tribunal de Justiça de São Paulo, onde seus argumentos também não obtiveram sucesso.

“É da escritura de doação que o não cumprimento das condições importará na rescisão automática da doação, revertendo o imóvel e sua benfeitorias ao patrimônio municipal, ao mesmo tempo em que a ré não comprovou minimamente que as construções que levou a efeito tenham sido levantadas sem recursos de entes públicos ou da comunidade, de sorte a autorizar alguma reparação com base no princípio que veda o enriquecimento ilícito”, conclui o desembargador  Ricardo Feitosa, em dezembro de 2018.

Essa decisão, proferida no Tribunal de Justiça paulista, tornou-se definitiva em 2020, quando se esgotaram as possibilidades de recurso por parte da Beneficência Hospitalar de Mairinque perante o Superior Tribunal de Justiça.

Cobrança de alugueis

Desde maio de 2016, tramita na Justiça um processo de execução, por meio do qual a Beneficência Hospitalar de Mairinque cobra da Prefeitura o valor de aproximadamente R$ 3,5 milhões, referente ao aluguel de parte do prédio, onde estão estabelecidos o Pronto Atendimento (PA) e o CEDEM.

* Simone Judica é advogada, jornalista e colunista do site www.vanderluiz.com.br (simonejudica@gmail.com)

Simone Judica

Advogada e jornalista.

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